Agricultor e pecuarista sob pressão: como navegar a volatilidade dos mercados internacionais? – Miguel Daoud

Agricultor e pecuarista sob pressão: como navegar a volatilidade dos mercados internacionais?

By 24/04/2025Artigos

 

O produtor rural brasileiro — seja agricultor ou pecuarista — está no centro de uma tempestade perfeita. A volatilidade dos mercados internacionais, impulsionada por tensões geopolíticas, flutuações cambiais e mudanças climáticas extremas, tem afetado diretamente a previsibilidade e a rentabilidade do setor agropecuário. O cenário atual exige mais do que resiliência: exige inteligência financeira, orientação técnica qualificada e estratégia comercial apurada.

O que está em jogo: incertezas externas, impacto direto no campo
As commodities agrícolas e pecuárias vêm enfrentando oscilações intensas. De um lado, a guerra comercial entre Estados Unidos e China continua a influenciar os fluxos de exportação global, abrindo oportunidades pontuais para o Brasil, mas também injetando instabilidade nos preços. Do outro, o avanço do protecionismo em diversas nações — inclusive com o retorno de tarifas unilaterais — coloca o mercado brasileiro em estado de alerta. Somam-se ainda os juros altos nos Estados Unidos, que drenam capital das commodities para a renda fixa, pressionando os preços em Chicago.

O produtor precisa mais do que sorte: precisa de estratégia
Financeiramente, é hora de repensar a estrutura de endividamento. Muitos produtores ainda operam com crédito rural tradicional, enquanto o mercado oferece alternativas como CPRs com proteção cambial, fundos de investimento em direitos creditórios (FIDCs) do agro, ou até mesmo operações de barter mais seguras. A volatilidade exige proteção contra oscilações, inclusive por meio de hedge com derivativos para travar preços mínimos de venda.

Tecnicamente, há uma necessidade urgente de intensificar a eficiência produtiva. Isso envolve o uso de tecnologias de precisão, manejo sustentável, rastreabilidade e gestão de riscos climáticos. O agricultor de sucesso não é mais apenas aquele que planta e colhe — é quem monitora, analisa dados e antecipa decisões.

Comercialmente, negociar com inteligência passa a ser vital. O mercado spot, apesar de atraente em picos de alta, pode representar riscos fatais em momentos de baixa. Buscar contratos futuros, estabelecer parcerias com tradings confiáveis e ampliar canais de exportação direta (inclusive com o apoio de cooperativas ou plataformas digitais) torna-se diferencial competitivo.

O papel do governo e das entidades de classe
O Brasil precisa repensar suas ferramentas de apoio ao produtor. Seguro rural ainda é escasso, o crédito oficial está engessado, e a burocracia penaliza o investimento produtivo. Enquanto isso, países concorrentes subsidiam pesadamente suas produções. Falta um verdadeiro “projeto de Estado” para blindar o agro das intempéries do mercado global.

Conclusão: o campo exige protagonismo e visão de futuro
A era da estabilidade acabou. O novo normal do agro é a volatilidade. Quem entender isso com rapidez, buscar orientação e se preparar com ferramentas modernas, terá não apenas condições de sobreviver, mas de crescer com rentabilidade. É tempo de parar de apenas reagir e começar a planejar estrategicamente — o campo não espera.

Esses são alguns dos pontos que tenho debatido em palestras e encontros com produtores em todo o Brasil. A complexidade do momento exige mais que informação: exige interpretação e direcionamento prático. O conhecimento certo, no momento certo, pode fazer toda a diferença na porteira para dentro — e também da porteira para fora.

MIGUEL DAOUD
Analista de política e economia para o agro do Canal Rural.